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Por Cleber Lourenço
O Exército Brasileiro atuou de forma direta para impedir a desmobilização do acampamento golpista instalado em frente ao Quartel-General em Brasília, segundo documentos e testemunhos colhidos na investigação da Ação Penal 2417, em trâmite no Supremo Tribunal Federal. A defesa do coronel Jorge Naime, então comandante de operações da Polícia Militar do Distrito Federal, relata que a PMDF tentou diversas vezes realizar operações para desmontar o acampamento, mas foi sistematicamente impedida por ordens e ações do Exército.
Um dos episódios mais marcantes ocorreu durante a madrugada de 8 de janeiro de 2023. A reportagem do ICL Notícias conversou com Mariana Naime, esposa do coronel Jorge Naime, que está impossibilitada de dar entrevistas por decisão judicial, já que o marido cumpre medidas cautelares como um dos réus nos inquéritos relacionados ao 8 de janeiro.
“Naquela madrugada, meu marido voltou pra casa profundamente consternado. Ele testemunhou algo que o deixou inconformado: o Exército Brasileiro, armado com fuzis 7.62, fez uma linha de isolamento não para conter manifestantes — mas para proteger o acampamento. Eles barraram a ação da PMDF, mostraram força bélica contra a própria Polícia Militar, impedindo que chegassem até o local. Foi um choque. Era como se o inimigo fosse quem tentava cumprir a lei”, relatou Mariana.
O documento aponta que o próprio ex-governador Ibaneis Rocha teria suspendido uma das operações após pedido do Exército. Há também registros de reuniões entre a Secretaria de Segurança Pública, a PMDF e o Comando Militar do Planalto (CMP), nas quais os militares rejeitaram o planejamento de retirada dos manifestantes e, em todas as ocasiões, inviabilizaram as ações propostas.
O coronel Jorge Naime, que era comandante da Polícia Militar do Distrito Federal à época dos acampamentos bolsonaristas (Foto: Divulgação)
Exército protegeu acampamentos bolsonaristas
Segundo os relatos reunidos pela defesa e por testemunhas ouvidas no processo, o Exército mantinha uma postura de rigidez e resistência, com soldados fortemente armados, blindados posicionados e escudos de choque voltados contra a tropa da Polícia Militar. Em um dos momentos citados, o general Dutra, então comandante, chegou a afirmar a um coronel da PMDF: “Acho que eu tenho um pouco mais de tropas que o senhor”.
Na tentativa de obter apoio institucional, o coronel Naime participou de uma reunião no Ministério Público Federal, em 14 de dezembro de 2022. Segundo ele, foi recebido apenas por um tenente-coronel do Exército, e não por um oficial de maior patente ou representante de decisão. A situação descrita pelo oficial é de sucessivos bloqueios e negativas por parte dos militares do Exército a qualquer tentativa de desmobilização, mesmo diante de ordens judiciais e planejamento estratégico da PMDF.
Os relatos descritos nos autos reforçam a tese da defesa de Naime de que houve sabotagem deliberada do Exército à ação das forças de segurança locais. As tentativas de diálogo com o Comando Militar do Planalto fracassaram, e os registros de reuniões mostram que, mesmo diante do agravamento da situação, o Exército manteve sua posição contrária à remoção dos acampados, contribuindo para a escalada que culminou nos ataques do dia 8 de janeiro.
Fonte: ICL Notícias