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De onde vem e o que quer o partido de extrema direita alemão AfD, apoiado por Musk?

O partido de extrema direita alemão AfD (Alternativa para a Alemanha), que tem conexões neonazistas e é monitorado pelo governo alemão por seus discursos de ódio, se tornou conhecido no mundo todo após declarações de apoio de Elon Musk e da saudação nazista feita por Steve Bannon ao mencioná-lo durante as comemorações de posse de Donald Trump.

Até agora, por causa do lema “Nunca mais na Alemanha”, que se refere ao regime nazista, a AfD era boicotada no parlamento alemão por um cordão sanitário mantido entre os outros partidos, que se recusam a fazer coalizão com o partido extremista que fala em “deportar aos milhões” e segue linha ultranacionalista e ultraneoliberal parecida com o “Make America Great Again” de Donald Trump.

Mas isso pode mudar nas próximas eleições à chanceler na Alemanha, que acontecem no dia 23 de fevereiro. A AfD tem ganho cada vez mais votos e por consequência mais poder, o que torna o boicote mais difícil. A candidata pelo partido, Alice Weidel, está em segundo lugar nas intenções de votos.

Ainda mais grave é que no dia 27 de janeiro, exatamente o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto, o representante da coalizão CDU/CSU que está em primeiro lugar nas pesquisas, Friedrich Merz, fez um aceno de que poderia votar junto com a AfD sobre endurecer políticas de imigração e asilo. Seria então o fim desse cordão sanitário, pactuado há mais de 10 anos.

Alice Weidel é considerada uma candidata controversa pela extrema direita cristã por ser uma mulher lésbica casada com uma imigrante, mas é a partir dessa contradição que se fortalece: sobretudo com os jovens.

Para entender de onde vem a AfD, os cenários possíveis para a política alemã e suas implicações para o campo da extrema direita mundial, a coluna entrevista com exclusividade o Dr. David Bebnowski, historiador e cientista social do Amerika-Institut da LMU de Munique. Ele observa o AfD desde seus estágios de fundação e publicou o livro “Die Alternative für Deutschland”e vários artigos sobre o partido.

David Bebnowski

Você poderia contar um pouco sobre o surgimento da AfD? Em que momento o partido é fundado e qual é sua ideologia?

A AfD foi fundada oficialmente em 2013, na esteira da crise financeira na Europa, especificamente a crise do euro. E as origens da AfD como grupo estão nos protestos eurocéticos. Naquela época, havia todo esse medo de que o euro, como moeda comum, fracassasse. E havia no espectro conservador e no espectro mais liberal da Alemanha, ou seja, entre os partidos FDP e a CDU, o medo de que a Alemanha perdesse sua vantagem competitiva devido à moeda comum.

E esse foi um dos núcleos em que se podia ver um novo poder ou uma nova força política alemã se formando, algo que não existia antes.

Isso aconteceu nas franjas desses partidos. Eles continuaram a existir mas alguns membros que aderiram a essa causa, por uma política fiscal alemã mais rigorosa, austeridade em relação aos países do sul da Europa deixaram o FDP e fundaram a AfD.

E tudo isso foi impulsionado por professores da economia neoliberal. Assim, o primeiro presidente da AfD foi Bernd Lücke e ele, com sua experiência como economista, argumentou que seria melhor para os estados do sul da Europa deixarem a zona do euro.

Houve um momento singular na política por volta de 2011 e nos anos seguintes em que você poderia basicamente empregar o raciocínio econômico como um meio de argumentar em termos nacionalistas ou etno nacionalistas. Assim, os estados do sul da Europa eram “fracos” e a Alemanha era “forte”, essa era a comparação feita o tempo todo.

Então por trás do euro como um símbolo comum de tudo o que estava fracassando na Alemanha naquela época, eles puderam introduzir sua própria agenda.

E, em termos da ideologia do partido, o que você vê agora na AfD é uma espécie de mistura que você vê em outras partes da nova direita: Não há uma ideologia uniforme. Acho que a única coisa que talvez mantenha o partido unido é uma autoimagem nacionalista e racista. Portanto, o medo da imigração. Mas, por trás disso, há diferentes agendas. Há integrantes muito neoliberais e orientados para o mercado, como os libertários, como a Beatrix von Storch, que também é bastante nacionalista e cristã evangélica radical e Alice Weidel. E temos pessoas como Björn Höcke, que é realmente um fascista. Ele é mais um defensor de uma política mais socialista. Não socialista em termos, é claro, de um sentido internacionalista ou tradicional, mas seria um defensor de um estado de bem-estar social, o que Beatrix von Storch e outros decididamente não são. Portanto, esses são tipos de divisões que poderiam romper o partido a qualquer momento. Em última análise, eles são unidos por algo que podemos caracterizar como o que Donald Trump diria, “make America great again”, o “make Germany great again”, com enormes conotações nacionalistas e, muitas vezes, racistas.

Sobre o cordão sanitário dos outros partidos contra a AfD, por que ele existe e por que é importante? O partido tem realmente conexões neonazistas?

Sim, a barreira contra a AFD é a grande coisa na política alemã. Existe o ditado “Nunca mais na Alemanha”. Essa é basicamente a promessa da CDU e de todos os outros partidos, de que nunca mais um partido de direita tomará ou governará a Alemanha. E a AfD tem se tornado cada vez mais um partido desse tipo. Não é possível que um partido como esse possa voltar ao poder. Esse é o paralelo com os nazistas. Em 1933, o presidente era conservador. Quero dizer, é claro, o sistema político mudou na Alemanha, o que de certa forma permitiu que os nazistas tomassem o poder. Hitler era o chanceler na época e estava nessa posição, como se fosse tolerado ou estivesse em uma coalizão com outras forças conservadoras. E, a partir daí, ele conseguiu aumentar o poder e erguer a ditadura nazista.

Esse é o paralelo histórico e é por isso que é tão onipresente no discurso político alemão que esse cordão sanitário é necessário. E isso nos leva à próxima pergunta: o partido realmente tem conexões neonazistas? Sim, podemos dizer isso. Mas temos que ter cuidado com a aparência do neonazismo hoje, certo? O neonazismo assim como a extrema direita passou por mudanças significativas e há uma modernização, por assim dizer. O movimento identitário [movimento de extrema-direita que se popularizou na Europa pós-II Guerra Mundial afirmando o direito dos europeus e povos de origem europeia a uma cultura e territórios reivindicados como pertencendo exclusivamente a eles] é a manifestação mais visível dessas tendências na política europeia. E há conexões estabelecidas entre AfD e o movimento identitário.

Björn Höcke, por exemplo, marchava em grandes protestos neonazistas e revisionistas do holocausto.

A AfD passou de um partido pequeno e rejeitado mesmo pela extrema direita europeia para um partido popular que ganhou eleições para um partido que o mundo todo agora conhece e está em segundo lugar nas eleições de fevereiro. Como isso aconteceu?

Essa rejeição da extrema direita europeia é relativamente nova, foi uma reação à reivindicação da AfD de reimigrar os imigrantes da Alemanha, e como isso foi visto como algo radical demais para os outros partidos se comprometerem. Acho que devemos ver as coisas sob esse prisma, e não como um compromisso forte anti AfD ou que a AfD não tem nada a compartilhar com esses partidos. Em termos de programa, ela tem muito em comum com outros partidos de direita na Europa.

É claro que há divisões entre esses partidos, por exemplo, a Frente Nacional, ou Rassemblement National na França. Eles são mais um partido voltado para o Estado, e a AfD, especialmente pessoas como Weidel ou Beatrix von Storch, não valorizam muito isso.

Por isso, eles dizem que o Rassemblement National é um partido socialista da mesma forma que Hitler é um comunista.

E como a AfD ganhou força? É uma mistura de coisas. Em primeiro lugar, as pessoas na Alemanha estão insatisfeitas com o desempenho dos outros partidos que estiveram governando nos últimos anos. Portanto, há o elemento do voto de protesto e a expressão do descontentamento. A segunda coisa é que a AfD é especialmente forte na Alemanha Oriental, e isso é um fator extremamente importante. Eles ganharam fama basicamente nos últimos dois anos como uma alternativa. Eles têm o termo “alternativa” em seu nome. Em termos de marketing, isso é super inteligente.

Como você vê a aproximação de Elon Musk com o partido? Você acha que isso vai influenciar na opinião popular sobre a AfD e nas relações dela com os outros partidos de extrema direita na europa?

Bem, em primeiro lugar é muito assustador que Elon Musk esteja apoiando a AfD abertamente. Isso influenciará a opinião popular? Não tenho certeza. Quero dizer, é claro, o partido está tentando obter o máximo de ganhos nisso tudo. E Musk organizou eventos com Weidel e esteve presente na reunião do partido no último fim de semana. Portanto, Musk está tentando ampliar a voz deles. E no ambiente de mídia cada vez mais digitalizado isso é assustador por si só. Mas é difícil ver se isso lhes dará ainda mais apoio, porque o partido está se mostrando tão forte entre as pessoas que não sei se Musk lhes dará mais alguns pontos percentuais.

Pesquisas têm mostrado que os jovens estão votando na AfD e que as ideias extremistas têm feito sucesso entre adolescentes. Como você vê esse fenômeno?

É profundamente preocupante e isso faz parte, eu diria, de uma tendência mais ampla, que podemos ver em outros lugares também. O que eu sei dizer é que o partido trata os jovens como membros plenos em suas preocupações. Eles parecem levar as tristezas e as preocupações dos jovens mais a sério do que outros partidos. O grande slogan da campanha de Scholz é algo sobre garantir fundos de pensão para a velhice. Essa é a política que o SPD e a CDU estão propondo. É realmente preocupante que eles não apresentem alternativas melhores ou ofertas melhores para os jovens. Acho que essa é parte da explicação. A outra coisa que todos apontam é, obviamente, a mídia social. E a AfD era a mais forte em mídia social ou em sua presença online mesmo antes da mídia social. Desde o início, eles perceberam imediatamente o potencial que isso poderia ter e se aproveitaram disso.

Friedrich Merz acenou que sua coalizão pode fazer parceria com a AfD para votar pautas sobre imigração. A candidata da AfD comemorou no X que seria o fim do cordão sanitário. A popularidade da AfD tem puxado a régua da política alemã para a direita? E você acha que o firewall vai de fato cair?

Não sei o que acontecerá, mas se a AfD votar junto com o CDU nessas questões, isso certamente será uma brecha no cordão sanitário. Além disso, é preciso ter em mente o quanto isso é simbólico. Ontem foi o Dia da Lembrança do Holocausto. Foi o 80º aniversário da libertação das pessoas de Auschwitz. E nesse dia, o CDU está discutindo restrições ao asilo e ao status de refugiado. Nesse dia, Merz está oferecendo à AfD a possibilidade de fazer uma parceria para fazer passar algo que o CDU quer, a propósito. Essa é outra coisa que devemos ter em mente.

Há uma mudança na direita devido à AfD. E o CDU e os políticos conservadores também se beneficiaram disso. Desde que a política de migração esteja na mesa, não há necessidade de falar sobre outras questões graves na Alemanha, como infraestrutura, moradia, porque tudo está concentrado em torno dessa questão e os partidos estão apenas jogando com o medo da migração e dos refugiados.

Alice Weidel é uma figura controversa, ao menos para a extrema direita cristã tradicional: é lésbica, casada com uma imigrante. Pode falar um pouco sobre quem é ela e que papel desempenha no partido?

Ela é polêmica, claro, mas Trump não é polêmico? Meloni? Le Pen? Eles não representam a maioria de seu partido, mas talvez esse seja o ponto. E é por isso que eles estão na posição que estão, porque dão algo a mais que o partido precisa ter. Não sei o que dizer sobre Bolsonaro, sei que ele vem do exército, talvez seja diferente…

Sim, Um clichê da extrema direita. E eu tenho certeza que nunca a extrema direita brasileira aceitaria uma mulher lésbica como sua representante. Nós temos uma extrema direita muito cristã fundamentalista.

Ok, são diferentes. Mas Weidel é uma típica representante da AfD. Ela é como eu disse no começo parte dessa fatia neoliberal que dominou o partido no começo e esse pensamento neoliberal, pensamento “libertário” tem uma forte inclinação para o autoritarismo, para ideias de etno nacionalismo.

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