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Em artigo, ministro Celso de Mello critica intenção de Trump de suspender habeas corpus


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Em mais um artigo para o ICL Notícias, o ministro Celso de Mello, que por 31 anos atuou no Supremo Tribunal Federal, critica duramente a possibilidade de o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, suspender o uso de habeas corpus.

Mello observa que a Constituição norte-americana só permite esse expediente em casos de “rebelião” ou de “invasão” do país — algo que, todos sabem, não está acontecendo.

“Tudo indica que esse possível ato executivo, embora arbitrário e inconstitucional (suspensão do “habeas corpus”) , poderá vir a ser praticado por Trump, indiferente ao que proclama a Constituição americana , em razão de sua arrogância desmedida (certamente embriagado pela “hybris” grega , capaz de despertar a “ira dos Deuses”) ou de sua inaceitável (e contraditória) pretensão de agir como verdadeiro “monarca presidencial” (ou absurdo “imperator mundi”)!”, alerta o ministro.

Leia o artigo a seguir:

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Presidente norte-americano, Donald Trump (Foto: Jim WATSON / POOL / AFP)

Trump e sua (inconstitucional) ameaça de suspender a garantia do habeas corpus

Por Celso de Mello*

A pretendida suspensão do remédio de “habeas corpus” pelo Presidente Trump, sem prévia autorização do Congresso americano, representa frontal e direta ofensa à Constituição dos EUA , cujo Artigo I, Seção 9 , estabelece que “The privilege of the writ of habeas corpus SHALL NOT be suspended, UNLESS when in cases of rebellion or invasion the public safety may require it.”

Note-se que a Constituição americana proclama que essa garantia constitucional NÃO será suspensa (é a regra) , EXCETO em casos de “rebelião” ou de “invasão” dos EUA, circunstâncias que, claramente, NÃO estão ocorrendo naquele país ! Nem rebelião nem invasão !

Vale rememorar, neste ponto, importante precedente histórico ocorrido no curso da Guerra Civil americana (1861-1865) , que envolveu discussão sobre os “war powers” (poderes de guerra) do Presidente dos EUA !

O “Chief Justice” (Presidente da Suprema Corte americana) Roger B. Taney julgou inconstitucional , em 1861 (início da Guerra Civil nos EUA) , o ato suspensivo do Presidente Abraham Lincoln, no caso “Ex Parte Merryman”!

Consoante decidiu Roger B. Taney , no processo “Ex Parte Merryman” (1861) , o ato de suspensão praticado pelo Presidente Lincoln , por ser excepcional , exigia prévia autorização do Congresso dos EUA, totalmente ausente naquele episódio!

O Presidente Lincoln, no entanto, a despeito da gravidade do seu ato , *descumpriu essa ordem de HC concedida pelo “Chief Justice” Roger B. Taney !

O Congresso americano , contudo, veio, posteriormente, a editar , em 1863, o “Habeas Corpus Suspension Act”, que foi uma lei temporária que vigorou até o fim da Guerra de Secessão , em 1865.

Essa lei também ratificou aquele e outros atos suspensivos do HC editados por Lincoln ( foram três) , sem prévia autorização congressional , praticados antes de sua vigência.

Somente duas vezes , no constitucionalismo americano, um Presidente daquele país recusou-se a executar (“to enforce”) ordem mandamental emanada da Suprema Corte dos EUA.

Esse fato ocorreu , pela primeira vez , no caso Worcester v. Georgia (1832) , julgado pela Corte Suprema americana, em que se reconheceu “a soberaniua tribal” e a ausência de poderes dos Estados-membros da Federação para legislar sobre territórios indígenas (no caso, a tribo Cherokee).

O Estado da Geórgia recusou-se a cumprir a decisão da Suprema Corte, no que teve o inteiro apoio do Presidente Andrew Jackson , a quem se atribuiu esta frase desafiadora : “John Marshall has made his decision; now let him enforce it!” (“John Marshal proferiu a sua decisão; agora, ele que a execute!”)

A segunda vez em que um Presidente americano desobedeceu uma decisão judicial foi aquela acima mencionada , logo no início deste texto, referente ao julgado proferido pelo Presidente da Corte Suprema americana Roger B. Taney (“Ex Parte Merryman”) , descumprido pelo Presidente Lincoln (1861).

A grave ameaça de Trump , de suspender por “executive order” , o remédio constitucional do “habeas corpus”, sem anterior aprovação do Congresso dos EUA ( e inocorrente , também, situação caracterizadora de “rebelião” ou de “invasão”) , ainda subsiste , mesmo porque tal intenção sequer foi desmentida pelo Presidente americano, que deveria conhecer – parece que não – a Constituição do seu próprio país !

Tudo indica que esse possível ato executivo, embora arbitrário e inconstitucional (suspensão do “habeas corpus”) , poderá vir a ser praticado por Trump, indiferente ao que proclama a Constituição americana , em razão de sua arrogância desmedida (certamente embriagado pela “hybris” grega , capaz de despertar a “ira dos Deuses”) *ou de sua inaceitável (e contraditória) pretensão de agir como verdadeiro “monarca presidencial” (ou absurdo “imperator mundi”) !

Após pouco mais de 4 (quatro) meses no exercício da Chefia de Estado e de Governo dos EUA , o Presidente Donald Trump tem demonstrado, de modo inequívoco, por ações, gestos e declarações , (a) que desconhece a História (e que, por isso mesmo, está fadado a repetir-lhe os erros) , (b) que revela ultrajante menosprezo pela dignidade de Povos e grupos vulneráveis , (c) que transgride princípios fundamentais que moldaram as relações internacionais dos Estados modernos , como aqueles consagrados pelos importantes Tratados de Paz de Westfália, de 1648, (d) que desrespeita a Carta de São Francisco de 1945 (ONU), no ponto em que proclama a igualdade soberana dos Estados nacionais (Artigo 1, n. 2, e Artigo 2, n. 1) , (e) que descumpre (veja-se o caso do canal do Panamá) o postulado básico da boa-fé e do respeito aos tratados e convenções internacionais (“pacta sunt servanda”), proclamado pela Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (Artigo 26), entre outros expressivos valores que iluminam e fortalecem o catálogo dos direitos e liberdades essenciais da pessoa humana e que ordenam as relações no plano internacional !

Uma última observação :

KARL MARX , em seu “O 18 de Brumario de Luis Bonaparte” (1852) , INICIA a sua obra, PROFERINDO , logo no primeiro parágrafo, a sua célebre frase :

“Hegel observa (…) que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, , por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: A PRIMEIRA VEZ COMO TRAGÉDIA , A SEGUNDA COMO FARSA (…)”

Eis , nesse possível gesto autocrático de Donald Trump, a História podendo repetir-se , só que desta vez como farsa …

 

*Ministro aposentado e ex-Presidente do Supremo Tribunal Federal, biênio 1997-1999)





Fonte: ICL Notícias

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