MANAUS — A seca do Rio Negro em Manaus isolou até fluxos de água. A situação ocorre na Marina do Davi, na Ponta Negra, zona oeste da capital. Local de intenso fluxo de embarcações privadas de lazer e transporte de ribeirinhos para comunidades da zona rural da capital, a Marina é hoje uma extensa área de areia e lama. O único veio de água está bloqueado por uma Balsa Fluvial de Endemias da Semsa (Secretaria Municipal de Saúde) que ficou atravessada no leito do rio.
Flutuantes comerciais e de atracadouros para embarcações estão em terra firme. Alguns, na parte mais funda do rio, estão presos na areia. É o caso da base de pesquisa do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia). O ATUAL constatou a situação nesta quarta-feira (2).
Funcionários do Instituto usaram enxadas para abrir uma canaleta para que a pouca água no leito do rio pudesse fluir. É que a balsa encalhou exatamente no canal por onde passa água, que fica represada somente de um lado. O flutuante do Inpa serve de apoio aos pesquisadores quando o rio está cheio.
A balsa foi ancorada na Marina do Davi no dia 16 de maio deste anos para atender 74 comunidades. Funciona das 8h às 17h30 para assistência de saúde como aplicação de vacinas. Para chegar à embarcação é preciso andar. A dificuldade de acesso reduziu o atendimento praticamente a zero.
O ATUAL consultou a Semsa sobre porque a balsa foi mantida no local mesmo durante a seca do rio, mas não houve resposta até a publicação da matéria.
Afetados
A situação afetou o trabalho no local. O mecânico marítimo Marcos Antônio, de 69 anos, dono de três flutuantes no local em que faz reparos em embarcações, ficaram encalhados. “As dificuldades são porque agora os barcos não chegam até aqui [flutuantes] e tenho que ir lá fora para fazer os serviços”, disse.
Marcos Antônio disse que está se mantendo com os trabalhos que ficaram pendentes do ano passado. A renda da família diminuiu porque não há condições para trabalhos mais longos porque não há onde atracar os barcos.
Moradores de comunidades que utilizam a Marina para desembarcar em Manaus também sofrem com o isolamento. Morador da Comunidade Ebenézer, o pescador Josué Bastos Gama, de 49 anos, relatou que antes levava 45 minutos no trajeto até Manaus, agora na seca o tempo é de 1h20.
Na quarta-feira, Josué Bastos veio a Manaus trazer a esposa para atendimento de saúde. Ela foi ao médico sozinha e ele voltou para casa porque os animais e a horta precisam de cuidados. “Os peixes sumiram”, disse, ao revelar que a pesca é uma das fontes de alimentos da família. Ele disse que recebe cesta básica da Prefeitura de Manaus.
Passagem
Os trabalhadores que fazem transporte fluvial de pessoas às comunidades, praias e flutuantes para lazer também foram afetados, uma vez que o fluxo de pessoas diminuiu em 80%. Com a seca, o transporte é apenas de moradores das comunidades.
Adonis Custódio, que faz parte da Cooperativa Aquaviário de transporte de Passageiros, trabalha há 18 anos no serviço. Ele disse que os trabalhadores estão usando lanchas pequenas, pois as maiores não conseguem chegar à Marina do Davi.
Antes, as lanchas levavam até 80 pessoas, mas agora as menores transportam de 6 a 15 passageiros. “Houve também uma adaptação de valores. Antes a viagem era 12 reais para as comunidades mais próximas, mas agora as lanchas não conseguem chegar no porto e eles precisam pagar um rabeta [canoa com motor de hélice longa] para os levar”, conta Adonis Custódio. A passagem custa R$ 10.
A Defesa Civil estadual informou que a estiagem afeta 86.921 mil famílias no Amazonas – 747.642 mil pessoas. Essa é considerada a segunda maior seca do estado em 120 anos, atrás apenas da de 2024, quando a cota do Rio Negro atingiu 12,70 em 26 de outubro. Nesta quinta-feira, a profundidade do Rio Negro na orla de Manaus é de 12,77m.